terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A solução do transporte público

Sou totalmente entusiasta dos transportes públicos.

Talvez por viver boa parte do meu tempo na cidade de São Paulo, onde o trânsito é caótico, coaduno com a posição de muita gente que aparece na TV dizendo que a solução são os meios de transporte alternativos. Ciclovias, corredores de ônibus, metrô, trens, enfim. Se não jogar milhares de toneladas de poluição no ar, então, tanto melhor.

Mesmo porque, além de tudo, o transporte particular (leia-se automóvel) em minha opinião é muito mais desgastante. O condutor tem que prestar atenção em tudo o que está acontecendo à sua volta, tomar cuidado com os motoboys que passam arriscando suas vidas nos corredores das vias, tomar cuidado com os outros motoristas, enfim. Dentro dos transportes públicos, na grande maioria das vezes, é sentar e esperar.

Também é relevante o preço do transporte. Na maioria das vezes, é muito mais barato pagar uma irrisória taxa de ônibus para se deslocar do que comprar um carro e arcar com sua manutenção o tempo todo. Combustível, seguro, IPVA, manutenção, enfim. Tudo isso consome uma grana relevante.

Sem contar com o meio ambiente. Eu não sou ativista ambiental, mas mesmo assim não posso fechar os olhos para os maiores causadores de poluição do país: os carros.

Não mudei minha opinião em relação aos transportes nestes últimos tempos: sigo achando que a melhor alternativa ainda são os transportes públicos.

Entretanto atualmente eu já não faria uma campanha do tipo "deixe seu carro em casa". Uma campanha como esta incentivaria uma troca: a troca do transporte particular pelo transporte público.

Acontece que nos últimos tempos me dei conta que uma simples troca já não é mais viável. E explico porque:

Num trajeto da cidade de Guarulhos até a Universidade de São Paulo, ida e volta se gastaria, e valores de hoje:
R$3,75 de ônibus intermunicipal EMTU para chegar até o metrô Armênia
R$2,90 de metrô
R$3,00 de ônibus municipal SPTrans da cidade de São Paulo

R$9,65 para ir. +R$9,65 para voltar. =R$19,30 na soma, o trajeto de ida e volta.

Fazendo-se este trajeto em todos os dias úteis, se tem o gasto de R$96,50/semana.
Num mês de 30 dias, sendo 21 deles dias úteis, o gasto é por volta de R$400,00.
Em um ano com 11 meses úteis, quem precisa destas 03 conduções todos os dias paga nada mais nada menos que R$4400,00.

Isso é um assalto.

E para mim, ao menos, ficam algumas perguntas:

1ª Se um indivíduo sozinho dentro de seu carro consegue fazer o trajeto Guarulhos-USP-Guarulhos gastando bem menos que R$19,30, como é que os caras que carregam MILHÕES de pessoas em seus trens e ônibus não conseguem fazê-lo, uma vez que em um ônibus cabem pelo menos 70 pessoas?!

2ª Se chegamos ao cúmulo de pagar R$3,75 em uma passagem de ônibus intermunicipal, então porque é que só passa 01 ônibus a cada 15 minutos?

3ª Quanto recebe um motorista de ônibus?

4ª Quanto recebe um cobrador de ônibus?

5ª Quanto recebe (sim, em Guarulhos isto existe) um motorista-cobrador?

6ª Para onde vai tanto dinheiro?

7ª Como pode ser mais caro que uma pessoa se desloque com outras tantas num ônibus do que se esta mesma pessoa usar seu próprio carro para fazer o mesmo trajeto?

8ª É possível incentivar o transporte público desta maneira?

Diante disto tudo, acredito que uma troca já não seria justa com a população. Não é justo pedir ao povo que abandone seu carro, abra mão de seu conforto conquistado com base em seu suor, e pague mais caro ainda para andar de transporte público abandonado e sustentar a corrupção de um penca de engravatado filho da puta (perdão) que só anda de helicóptero.

Mas qual é a solução para o transporte público então?

Simples: fazer a cidade parar. Chegar um dia em que ninguém se desloca na cidade. Forçar os magnatas todos a comprar helicópteros. Helicópteros esses que não poderão circular em dias de chuva, e farão com que seus donos percam seus compromissos por conta do trânsito. Na hora em que os (literalmente) cachorros grandes se sentirem prejudicados, não tenha dúvida de que teremos rapidamente uma solução para o transporte público. Não tenha dúvida disso.

A solução para o transporte público está no transporte privado. Vamos encher as ruas de carros, até que não haja mais ruas para eles.

Neste momento então, veremos quando haverá outro aumento no preço do busão.

É isso.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Ídolos do futebol, e marketing

Já faz algum tempo que o futebol se rendeu ao mercado. Se hoje é irritantemente comum ouvir falar em "profissionalização do clube", "marca X. F.C.", "nossos consumidores" (no que se refere aos torcedores), "o clube deve operar como uma empresa" e outras coisas do tipo, não se pode acreditar que sempre foi assim.

Este discurso é eminentemente recente, a propósito.

A entrada do futebol no mundo dos negócios, entretanto, não é tão recente assim. Conforme o Brasil e o mundo foram tornando mais intensos seus respectivos processos de modernização, paralelamente foi avançando o processo de modernização (ou corporativização) dos clubes.

Os clubes de futebol mais importantes do nosso país, e talvez mesmo os clubes mais importantes do mundo surgiram como associações desportivas, sem fins lucrativos, cujo intuito era agregar dentro de si os sócios para a prática de desportos e haver algum convívio social interno. Reuniam pessoas de uma mesma comunidade, conhecidos, em um ambiente familiar, de proximidade. Eis um trecho do estatuto da Sociedade Esportiva Palmeiras:

"TÍTULO I

DA DENOMINAÇÃO, SEDE, FIM E DURAÇÃO.

Art. 1º - A Sociedade Esportiva Palmeiras (SEP), com sede social,
administrativa e foro jurídico em São Paulo, Capital, na
rua Turiaçú, 1840, Perdizes, CEP 05005-000, fundada com
o nome de Sociedade Esportiva Palestra Itália, em 26 de
agosto de 1.914, alterado para o de Sociedade Esportiva
Palestra de São Paulo, conforme ata da sessão de 27 de
março de 1.942, e mantida com o nome atual, conforme
ata da sessão de 19 de outubro de 1.942, é uma entidade
civil de caráter desportivo, com personalidade jurídica de
direito privado, sem fins econômicos lucrativos, constituída
na forma da lei, mediante o exercício de livre associação.

Art. 2º - A sua finalidade é promover, difundir e aperfeiçoar a
prática da educação física, de desportos em geral, formais
e não formais, bem como promover as culturas morais,
artísticas, cívicas, sociais, recreativas e educacionais dos
associados que a compõem, além de todas as atividades
complementares inerentes ao alcance dos objetivos
sociais, podendo, ainda, participar de outras sociedades,
como quotista ou acionista, mediante a aprovação do seu
Conselho Deliberativo (C.D.)."


Isto foi uma mera ilustração. Este é o link para o site da SEP. Neste estatuto não há nenhuma menção a empresa, corporação, nem nada do tipo.

Com o tempo, as massas foram aderindo aos clubes de futebol, que perderam a característica da proximidade entre os sócios. A princípio, eram os próprios sócios os únicos torcedores dos clubes.

Com o passar do tempo, as torcidas foram se desvencilhando de seus clubes sociais originais. Daí alguém teve a brilhante ideia de fazer com que os torcedores gerassem dinheiro para os clubes. É a partir deste momento que se inicia a trajetória do marketing esportivo.

Pois bem, o tempo foi passando, e o marketing esportivo foi avançando. Primeiro foram os patrocínios de camisa. Depois a lei Pelé, que dava ao jogador status de funcionário do clube, uma inovação no Brasil. Aí começaram as ações de marketing, boneco pra cá, camisa comemorativa pra lá, e assim por diante. Os clubes se tornaram empresas, e os torcedores, consumidores. Pelo menos na ótica dos diretores.

Talvez o ápice do marketing esportivo no Brasil tenha sido a vinda dos Ronaldos para Corinthians e Flamengo, respectivamente.

Jogadores conhecidos mundo afora, cheios de empresas a seu redor (sim, alguns jogadores também se tornaram empresas) patrocinando-os, mandando em seus trajes, chuteiras e até cortes de cabelo (!!!!). São um prato cheio para o marketing esportivo.

E a imprensa (que conhece menos de futebol que os bêbados do bar da esquina da minha casa) elogia o marketing, uma fonte alternativa de receitas, a modernização, o profissionalismo desses clubes. Até aí tudo bem. O problema é que quem se rasga em elogios perante contratações e ações como estas (me refiro às contratações dos Ronaldos, nesse caso) só enxerga um lado da moeda.

Semana passada aconteceu algo que os marketeiros não previram: sua galinha dos ovos de ouro não jogou nada pela 5ª vez consecutiva no ano. Isto culminou na eliminação de sua empresa por um time totalmente desconhecido dos brasileiros, e a revolta de seus torcedores. Que fazer com o marketing agora?

Eu, particularmente adorei o modo pelo qual isso se desenrolou, por dois motivos principais:
1º: Sou palmeirense.
2º: Odeio quando tratam o futebol como um frio negócio.

Depois da última quarta-feira ficou muito claro que futebol não se ganha no marketing, mas sim no campo. Prova disso é que bastou a saída dos dois "astros" somada a um pouco mais de brio no time para que (veja só) vencessem o meu time (o Palmeiras, seu maior rival), 04 dias depois da fantástica eliminação.

Não se deve dar tratamento de ídolo a quem de fato não o é. O travequeiro não tem, e nunca teve identificação com o SCCP. Aliás, com que clube ele teve alguma identificação? Barcelona? Então porque jogou no Real Madrid? Inter de Milano? Então por que jogou no Milan? Diz que torce para o Flamengo. Então por que o preteriu e foi para o Corinthians?

O cara ainda me vem falar de amor?! Amor ao Corinthians? Ah, me poupe, vai...
Então porque não parou de comer/beber/farrear pra jogar decentemente pelo Corinthians? Se isso é amor, então a minha concepção sobre o assunto deve estar bem equivocada.

O outro Ronaldo, o agora flamenguista, a exemplo do chará, preteriu seu suposto clube do coração (o Grêmio) para rumar ao Flamengo. Este já foi bem mais descarado e não deixou dúvidas que o fez justamente pelo dinheiro. Pelo menos foi mais honesto.

Ídolos não são contruídos nas propagandas, em ações de marketing, ou qualquer frescura do tipo. Pára! Só existe um lugar dentro do qual um ídolo pode ser cunhado: o campo de jogo. E nenhum mais. E isso independe de caráter, conduta sexual, ficha criminal e o que quer que seja. E acima de tudo exige respeito à camisa que se veste. É o mínimo. E não me venha reclamar que teve o carro arrebentado. Ainda ficou muito barato, sinceramente. Acho que esses caras não têm noção do que é futebol.

A Nike deve ter virado a cabeça deles.

Por hoje é isso.