segunda-feira, 19 de julho de 2010

O Ocidente dos antropólogos

Nas férias não tenho a obrigação de ler nada. Talvez seja por isso que as postagens neste blog se tornem mais freqüentes justamente durante o período de férias. Quando a carga de leitura diminui, a carga de raciocínio aumenta.

O post de hoje será absolutamente massante para quem não se interessa por ciências humanas (leia-se antropologia, nesse caso). Mas como a idéia do blog é justamente a de escrever o que acho que deva ser escrito, lá vou eu:

Não sei se existe de fato (um tipo de) "propósito final" na antropologia. Talvez não. Mas certamente pode-se dizer que uma de suas premissas é jamais avaliar o outro de acordo com seus (de quem avalia) próprios parâmetros. Se alguém o faz, este alguém é um etnocêntrico, um cara que avalia outros grupos de acordo com os parâmetros dos grupos nos quais o etnocêntrico está inserido. Esta é uma das lições mais básicas que se aprende em um curso de antropologia.

Pois bem. Pelo pouco que estudei desta matéria, pude perceber que uma forte corrente que se desenvolve nela é o estudo de agrupamentos periféricos (indígenas, na maioria das vezes) e a busca, dentro desses agrupamentos da forma pela qual eles se constroem enquanto grupo.

Isso é muito bonito, em minha opinião. Uma vez que a maioria das pessoas tende a avaliar determinado grupo de acordo com parâmetros que não são os do grupo avaliado, é um trabalho realmente nobre buscar compreender o outro da mesma maneira pela qual ele próprio se concebe.

É a partir daqui que eu entro. Conversando com alguns amigos meus da área, tenho percebido uma recorrente preocupação com a compreensão de grupos periféricos. Não acho que isso não deva ser feito, é bom que se diga.

O problema é que percebo uma espécie de "sinismo" nisso tudo. Sei que a palavra é pesada. Mas é meio revoltante, leitor. Vou explicar a origem da minha "revolta":

Os antropólogos são sempre os primeiros a dizer que não existe raça, cultura... provavelmente em algum tempo nem mesmo a divisão de "sexo" irá sumir. Beleza. O problema é que os estudantes de grupos periféricos buscam sempre uma comparação com o "Ocidente". Este post gostaria de perguntar aos antropólogos:

Quem é o Ocidente?

É a baiana que se veste com aquelas roupas brancas tradicionais, vende acarajé e reza para Iemanjá? Ou é o gaúcho que veste bombacha, toma chimarrão e dança fandango? Ou é o americano que ouve Lady Gaga, dança Michael Jackson e come no McDonald's? Quem é o Ocidente? São todos eles? Ou não é nenhum deles?

Mais ainda:

Se existe uma constante insistência em dizer que cada lugar é um lugar, e que cada "cultura" (sempre com aspas) é uma cultura, então por que é que se põe o "Ocidente" inteiro dentro do mesmo saco? Dª Antropologia, a senhora não julga falar em "Ocidente" um erro conceitual de sua própria constituição? Isso não é uma (espécie de) "generalização do ingeneralizável"?

Me arriscaria dizer que é um mero recurso retórico que permite aos estudantes de grupos periféricos dizer algo do tipo:

"Está vendo, os Xs têm uma concepção de espaço diferente dos ocidentais." ou "Enquanto no Ocidente se pensa assim, nos Ys se pensa de outro jeito." Mas os ocidentais têm realmente entre si uma concepção de espaço que é homogênea? Os ocidentais pensam do mesmo jeito?

Será que o "propósito final" (se é que este existe) da antropologia é se tornar um almanaque de curiosidades? Se não é, gostaria de saber que é "o Ocidente dos antropólogos".

Acho que já fui suficientemente claro em minha proposta. Vou parar por aqui.

É isso.

domingo, 18 de julho de 2010

Polêmica pra cachorro

Minha cabeça está pouco fértil esses últimos tempos. Isso não quer dizer que ela tenha parado de pensar, é bom que se diga.

O post de hoje se dedicará a polemizar. Acho que o que defenderei nele não será algo com que meus leitores(as) concordarão. Entretanto, como o nome do blogue já supõe, não há razão para se recear que ele defenda coisas doidas, não é verdade?

Pois bem. Recentemente recebi em meu email uma mensagem que se referia a um projeto de lei que, se entendi bem, visava proibir o sacrifício de animais no estado de São Paulo. Acho que era isso.

Meu escrito de hoje não se referirá diretamente a esta lei, mas sim ao tipo de relação que julgo ser cabida entre homem e animal dentro de uma sociedade (ao menos) predominantemente humana.

De uns tempos pra cá entrou na moda defender direitos dos animais. Do mesmo modo que também entrou na moda defender o verde e a preservação da natureza. Há 15 anos esse "discurso naturalista/preservacionista" era bem periférico. Hoje é ele quem predomina.

Não sou a favor do assassinato de cães nem da destruição da natureza. É bom que isso fique claro.

Mas o que me incomoda é o discurso de parte dos ativistas (principalmente dos) que defendem os "direitos dos animais". A meu ver, eles colocam os animais na frente dos seres humanos. É isso pra mim o que é inadmissível. Vou repetir: INADMISSÍVEL.

Como me dá raiva ver programas de TV (leia-se Luisa Mell e afins) em que se mostra Shopping para cachorros, estilista para cachorro, psicólogo (pasmem!) para cachorros. O que mais me espanta é saber que tem gente que se digna a gastar dinheiro com (me desculpe) absurdos desse tipo.

Enquanto isso, gente dormindo sobre papelão em calçadas não tão distantes, crianças pedindo esmola na rua, meninas vendendo o corpo aos 12 anos. E gente levando o seu lindo cãozinho ao dog stylist (acredite, esta aberração realmente existe). Muito bonito!

Aí vem o Exmo. Deputado (ou Vereador, ou sei lá o quê) propor que não se sacrifique os cães sem dono do estado. Pergunto ao propositor e aos defensores deste projeto de lei: é quem é que vai cuidar dos cães que não têm dono?

Eles serão cuidados pelo poder público? Então o governo terá que gastar dinheiro para alimentar e cuidar desses cães, certo? Hmmmm... então o que se poderia gastar em transporte, educação, saúde (humana, lógico) se gastará cuidando dos cães sem dono. Hmmmm... ótima maneira de gerir o dinheiro!

Ou então eles serão largados pelas ruas? Para serem atropelados pelos carros que passarem? Para ficarem sujeitos a doenças (que também podem matá-los) e transmití-las aos humanos? Isso realmente é melhor que o sacrifício?

Acho que a única maneira de um projeto de lei como este se tornar socialmente viável é a seguinte:

Uma ONG de defensores dos "direitos dos animais" se prontificar perante a sociedade a gerir com DINHEIRO PRIVADO os cães sem dono da cidade. A essa ONG ficaria a incumbência de promover um eficiente sistema de adoções, e cuidar dos animais enquanto sem dono. Com o dinheiro que ELES forem capazes de arrecadar de maneira privada. Aí sim. Não se pode admitir que se gaste dinheiro público com animais, enquanto há humanos com sérias necessidades, e uma vez que não são os animais os que pagam impostos.

Na inexistência de uma organização PRIVADA que se dedique (e se comprometa com o poder público e preste contas a ele) a isso, não se pode proibir o sacrifício de animais sem dono.

Sou defensor da idéia de que animais devem pertencer à esfera privada, com algun(s) cidadão(s) responsabilizando-se por esse(s) animal (is). Enquanto não perturbarem a ordem pública, ótimo. Se isso não ocorrer, o que vale é a lei da selva.

Para encerrar, uma historinha sobre isso:

Conta-se que na China colonial, devido ao fato de o Império passar por sucessivas crises de fome, o imperador certa vez proibiu que houvesse cães e gatos pelo império. Animal achado era animal na panela.

Justíssimo, a meu ver.

Não se pode admitir que em um lugar onde se passa fome alguém ouse dar comida a um animal ao invés de alimentar a outro humano.

É justamente nessa linha que defendo ser um absurdo se gastar dinheiro cuidando de animais enquanto há outros humanos (como o(s) dono(s) deste dinheiro) com mais necessidades, sendo estas muito mais importantes de serem atendidas do que as dos animais.

É isso.