(Continuação do post "Lula e a democracia brasileira")
Se no plano do poder Executivo, o acesso ao poder tornou-se mais democrático com a eleição de Lula, no plano Legislativo o mesmo demorou um pouco mais para ocorrer.
Até 2002, não tínhamos candidatos ao Legislativo diferentes de burocratas engravatados. Talvez a eleição estrondosa de Enéas Carneiro em 2002 fosse um indicativo de que o povo estava cansado de opções tão homogeneamente ruins.
A eleição é uma escolha de representantes. Uma vez que não há no rol dos candidatos ninguém que o eleitor olhe e diga "ah, este cara me representa", a democracia se enfraquece. Poucos são os deputados que se conhece. A relação cidadão-deputado só é mantida por um laço de obrigação eleitoral. Nada mais que isso. Depois da eleição, se esquece quem está lá. Não há identidade.
Clodovil Hernandes em 2006 e Netinho de Paula em 2008 se deram conta disso, e foram eleitos como deputado federal e vereador, respectivamente. Isso já foi um escândalo à sua época. Mas o mais escandaloso ainda estava por vir: O abestado. Tiririca se tornou em fenômeno do horário eleitoral paulista.
Minha opinião: vai se eleger, e provavelmente será o deputado com mais votos em São Paulo, e talvez bata o recorde de Enéas, de 1,57 mi de votos.
Isso é bom?
Tem muita gente metendo o pau no abestado. Dizendo que seria um retrocesso elegê-lo.
"Como é que pode alguém ser tão burro a ponto de votar no Tiririca?"
É o que ouço de diversos cantos. Eleger o abestado seria realmente um retrocesso?
Eu particularmente só não votarei nele por um motivo: ele não irá ao Congresso devidamente trajado caso eleito. Se ele prometesse ir à Câmara dos Deputados como Tiririca, e não como Francisco Everardo Oliveira Silva, certamente teria o meu voto.
Com raras exceções o Legislativo brasileiro em geral é ainda algo que paira a uma gigantesca distância do povo brasileiro. O povo vota porque é obrigado, não porque acha que deve votar.
A questão é que candidatos com quem o eleitor de fato se identifique só começaram a aparecer agora. E o que é representação se não a identificação entre representado e representante?
Tiririca é um homem público. Todo mundo sabe quem ele é, principalmente depois das propagandas políticas. Se ele fizer alguma besteira ou maracutaia enquanto no poder, sua carreira (política e artística) estará acabada. Ele nunca perderá o estigma de corrupto caso se envolva em algum "esquemão" dentro do Congresso Nacional.
Além disso, se eleito, estará sob constante vigilância. De todos. Será de fato um representante. Não será alguém que já nem se lembra quem é um mês depois da eleição.
Este blogueiro interpreta a potencial eleição do "abestado" mais como um progresso no que diz respeito à qualidade e à intensidade da representação política no plano Legislativo brasileiro do que como um retrocesso.
Com a eleição de gente conhecida para a ocupação dos cargos de poder nacionais, a cobrança que pode ser exercida é absurdamente maior. O poder não está nas mãos de um "sem-nome" qualquer, mas sim nas de alguém extremamente conhecido, que será cobrado (principalmente pelos que se opuseram à sua candidatura) até o final de seu mandato, se conseguir chegar lá.
Tiririca é um avanço, não um retrocesso. Uma vez que os engravatados não inspiram a confiança de ninguém, o Tiririca inspira. Mesmo que seja numa espécie de "voto de protesto", ou o que quer que seja.
Além de tudo, o cara ainda zoa, dentro de suas próprias propagandas a distância que separa o povão dos cargos legislativos hoje em dia.
"Você sabe o que faz um deputado federal? Bom, na realidade eu também não sei. Mas vota em mim que eu te conto." Tiririca
E é isso mesmo. Você, leitor, sabe o que faz um deputado Federal? Eu (o blogueiro) tenho uma vaga (eu disse vaga) noção, e olhe que eu estudei Política I, II, III e IV.
"Trouxe minha família para comover o eleitor" [...] "Pede voto, pai. Pede voto, mãe. Sorri, pai. Sorri, mãe." Tiririca
O abestado vai sacudir a política nacional. Já está sacudindo. E muita coisa tende a mudar (pra melhor) com sua eleição. Mesmo que esta mudança seja oriunda de uma reação conservadora partida de quem não admite uma derrota para um palhaço.
"O povo não é palhaço. Mas eu sou." Tiririca
Que você acha do abestado, leitor?
É isso.
domingo, 19 de setembro de 2010
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grande renan!
ResponderExcluirconcordo com voce! além do que, tiririca representa grande parte da populaçao brasileira: os analfabetos. Independente se ele saiba ler ou nao, a mídia ressaltou o fato do palhaço nao conseguir ler ou escrever. Entao acredito, que boa parte de seus votos -nao a maioria- vieram de pessoas analfabetas, que até pouco tempo atras nao tinham liberdade de votar, E CLARO, que a maioria dos votos foram dos eleitores que nao depositam mais confiança na nossa política, um voto pra mostrar que tem muito mais palhaço que ele ali no
Oie Alemão!
ResponderExcluirAh, gostei do seu post! Não sei se concordo que um Tiririca da vida será mais "vigiado" pela sociedade do que um político comum. Acredito que não, porque a maioria dos que votaram nele fizeram isso porque não acreditam na política né... Foi mais um voto de protesto. Se ele tivesse feito uma campanha com base em um projeto político bem definido aí sim... mas não foi o caso né. Mas também acho que a candidatura dele foi uma boa coisa para a democracia. Um professor meu da Faculdade de Direito que me lançou essa ideia e eu fiquei pensando nisso um tempão: quem disse que o Tiririca não pode se candidatar né?! Todos podem concorrer numa democracia!
Mas acho que o apelo humorístico do Tiririca fez a diferença. Bom, eu fiz uma reportagem pro Jornal do Campus exatamente sobre isso e tem uma entrevista fantástica com um professor da História! Dá uma olhada quando der... http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2010/09/celebridades-puxam-votos-para-seus-partidos/
Bjoss, Naty.